sábado, 30 de abril de 2016

Quando a relutância política se sobrepõe ao medo europeu

           Marcava o calendário o ano de 1950, quando René Pleven, Primeiro-Ministro francês na altura, propôs aos seus parceiros comunitários a criação de uma Comunidade Europeia de Defesa (CED) inspirada no modelo da CECA. Facto é que o êxito da iniciativa de Schuman fez com que os seus Estados fundadores começassem a admitir a possibilidade de alargarem o processo e o método comunitário a outros domínios, neste caso a tão necessária defesa, onde a integração pudesse ser igualmente vantajosa. Desta forma, esta iniciativa marcava uma solene e relevante tentativa de integração europeia na área da defesa, através da criação de uma organização que englobasse um exército europeu integrado e colocado sob uma autoridade comum. Contudo, este projecto acabou por fracassar na sua totalidade, pois embora a ideia tenha sido bem acolhida, uma das razões que haviam que haviam catalisado a CED para o infortúnio prendeu-se com o facto de ainda ser demasiado cedo para um projecto de tal natureza, uma vez que previa a criação de uma comunidade supranacional num domínio tão sensível como o da defesa.
            Neste sentido, avançando cronologicamente para o presente ano, constatamos que a Europa tem sido alvo de inúmeros ataques terroristas, que desbravam os alicerces defensivos europeus sem qualquer tipo de  misericórdia . Ainda assim, Jorge Domecq, o actual director-executivo da Agência Europeia de Defesa, veio a público afirmar que a Europa encontra-se “confrontada como uma nova situação de segurança”. Neste cenário pouco animador, o diplomata defende também que as fronteiras entre a segurança interna e a segurança externa desvaceram-se de tal modo, que as as ameaças assumem cada vez mais um carácter transnacional, fazendo com os Estados-membros tenham em primeiro plano a cooperação necessária para enfrentar esta situação. Situação esta, que para Domecq, vislumbrará na sua resolução a criação de um patrulhamento armado por militares nas cidades europeias.
            Numa linha de consenso com estas palavras, Barack Obama, que acaba de visitar a Europa,  não se conteve nos elogios ao “velho continente”, como também ainda teve tempo de deixar um breve conselho à comunidade europeia. Obama salientou, que se por um lado a União Europeia caminha para uma luz cada vez mais próspera, assente em valores democráticos, por outro tem assumindo uma postura tenra em relação a matérias de segurança internacional- “Vou ser honesto: a Europa tem sido por vezes complacente com a sua própria defesa”- disse o Presidente norte-americano. Desta forma, Washington pediu uma acção europeia mais convicta contra os ataques terroristas executados pelo Estado Islâmico, acrescentou ainda o papel decisivo dos países europeus no combate contra os jihadistas na Iraque e Síria. Obama aproveitou ainda o momento para alertar os europeus para os riscos de uma Rússia mais invasiva, para que não se retirasse a sanções contra Moscovo.
            Assim sendo, é de conhecimento universal que a Europa comporta na sua essência uma importância megalómana, mas que muitos tendem a subestimar, no entanto, no que se refere à defesa, a vontade é imensa, tal como Jean Claude Junker já havia afirmado que “um exército conjunto da União Europeia mostraria ao mundo que nunca mais poderá haver uma guerra entre países europeus”. Esta ideia, que de nova não tem nada, culminaria na construção de políticas externas e de segurança comuns, permitindo assim à Europa assumir um papel de protagonista no que concerne à questão da defesa internacional            Numa primeira perspectiva, a ideia reúne todos os elementos tentadores, ora a União Europeia possui a maior economia do mundo, tem mais de 500 milhões de habitantes, ou seja, recursos humanos é o que não lhe escasseia, assim como financeiros e tecnológicos de forma a criar uma força militar de reverência. Todavia esta ideia tem de tanto de relevante como de perigosa relativamente ao modo como seria posta em prática, pois levantam-se questões como quem comandaria este exército, se a composição do mesmo passaria por contingentes nacionais destacados, tal como acontece na NATO, ou por todas as forças militares dos países membros da União, e ainda como seria suportados os custos deste exército.
            Ainda assim, é de toda a importância referir que esta opção política abraçaria a tese federalista, que como se sabe é rejeitada por Londres, pois iria acrescentar à bandeira e à moeda comum um vínculo de força militar. Um desejo que à muito que se ambiciona, na medida em que esta não é um utopia que vem à superfície de vez em quando, mas sim algo concreto, que poderia constituir-se como um elemento dissuasor em muitos conflitos internacionais. Engane-se quem pensa que estas constantes ameaças terroristas se resolveriam no seu âmago apenas com um exército militar europeu, é preciso também uma resposta de  prevenção dos serviços de informações e, posteriormente, numa acção das unidades especiais das forças de segurança. Trata-se de um processo altamente complexo, que não pretende de todo uma exacerbação de força, mas sim em algo capaz de prevenir que a Europa continue a “sangrar” e a “tremer” de medo.
            De facto, não restam dúvidas, que quando se toca no assunto da defesa, muitos países adoptam uma postura reticente, pois a perda de controlo e soberania que implicaria na sua defesa parece falar mais alto que uma ameaça que coloca em causa toda uma União, que tanto lutou para por uma causa comum. A verdade, é que ainda hoje o sonho de  René Pleven ainda não se concretizou, embora muitos Estados-membros estejam empenhados na criação de uma. Tal só vem demonstrar a relutância dos Estados aceitarem que áreas sensíveis do seu ponto de vista escapem ao controlo directo por parte dos governos e instituições nacionais e sejam atribuídos a instituições supranacionais.
            Torna-se claro, que o modo como os Estados-membros perspectivam a política de segurança europeia de uma forma algo extremada e não consensual, pois ao que parece quando, infelizmente, acontecem actos terroristas surgem apelos para uma maior e mais intensa cooperação, todavia ao mesmo tempo também paira uma resistência, por vezes incompreensível, no que se refere também a uma defesa mais integrada.
            Longe vão os tempos em que o solo europeu não se deparava com ameaças, longe vão os tempos em que apenas se sentia o tremer do frio vindo dos nórdicos, agora treme-se  por uma bomba no próximo metro. Tal como aconteceu na área económica e política, a segurança, devia ser de uma vez por todas, prioridade, porque quando os cidadãos receiam o governo acaba sempre por balançar e, um governo que balança nunca estará firme.
          
Telma Pacheco nº216306 Fontes:
http://www.dn.pt/politica/interior/maioria-dos-paises-da-ue-rejeitam-exercito-europeu--4444154.htmlhttp://economico.sapo.pt/noticias/junker-e-o-exercito-europeu_214526.htmlhttp://observador.pt/2016/04/25/jorge-domecq-possibilidade-exercito-europeu-encarada-projeto-longo-prazo/

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