Penso que nunca se bateu tão fundo durante os 18 meses de confusões e trapalhadas dos líderes europeus nas suas tentativas de responder ao fluxo de refugiados e migrantes. Finalmente tornou-se claro o desespero dos europeus, que para conter a crise estão dispostos a ignorar completamente os direitos mais elementares.[1]
Judith Sunderland
O acordo celebrado entre a Turquia e a União Europeia sobre a “troca” de migrantes irregulares acolhidos nas ilhas gregas por refugiados sírios na Turquia, tem sido alvo de grandes contestações por parte dos eurodeputados e das Nações Unidas, tendo sido já acusado de violar os direitos humanos e de ir contra as obrigações vinculadas pela UE.
Este
acordo, mascarado pelo propósito de por fim à migração irregular que se tem
vindo a assistir nos últimos meses no continente europeu, tem, na realidade,
como objetivo último servir os intentos tanto dos líderes europeus, que tentam
a todo o custo evitar a fixação de milhares de refugiados nos seus países, como
os propósitos da Turquia, que vê neste acordo a possibilidade de liberalização
da entrada dos seus cidadãos no espaço Schengen, como também de iniciar os
preparativos para a sua adesão à União Europeia.
Todavia,
este acordo contém nas suas entrelinhas árduos encargos financeiros e políticos
para a UE, exigindo o dobro das verbas que inicialmente se havia previsto, como
também a hipótese, cada vez mais real, da entrada da Turquia na UE, entrada
essa que, exalta profundas cisões entre os europeus.
Partindo
do princípio que o acordo estabelecido é legal, e que tem apenas como fim
último o desencorajamento da imigração ilegal e do tráfico humano, não nos é
possível, ainda assim, ignorar o facto de se colocar “em cima da mesa” a
possibilidade de “trocar” pessoas, como se de mercadoria se tratasse. “ Em
comunicado, a Amnistia Internacional perguntava como era possível que os chefes
de Estado e de governo, na Europa e na Turquia, estivessem dispostos a regatear
“os direitos e a dignidade de algumas das pessoas mais vulneráveis do mundo.
Esta ideia peregrina de trocar refugiados é perigosamente desumana e não
oferece nenhuma solução sustentável de longo prazo para a crise humanitária”.
[1]
Para
além dos obstáculos legislativos e legais que a “proposta de Ancara” enfrenta,
esta tem pela frente o estorvo do “inimigo” cipriota, que não demonstra
quaisquer intenções de ceder às pressões exercidas pela Comissão Europeia. O
Presidente, Nicos Anastasiades, já deixou clara a sua intenção de vetar todos
os processos que envolvam acordos respeitantes à adesão da Turquia à UE, caso a
Turquia não permita a abertura dos seus portos e aeroportos à República do
Chipre.
Em
tempos controversos e delicados, como aqueles que a União Europeia tem vindo a
vivenciar, há que ter em cautela a tomada de decisões enaltecidas por
sentimentos recalcados, não podendo nunca esquecer que a UE foi instituída
baseando-se no princípio “Unida na Diversidade”, e que ao se cometer o erro de
ignorar os nossos princípios fundadores por situações de “exceção”, estamos a
colocar em risco tudo aquilo que tem vindo a ser construído e alcançado por uma
união de Estados. Há que não esquecer que, entre potencialidades e fraquezas
dos seus Estados, a UE é constituída por 28 Estados-Membros, não “permitindo”
nenhum deles agir à margem dos restantes.
Ana
Leite, n.º 216283
[1]
Baseado em Siza, Rita, 2016. “Acordo sobre fluxo de refugiados entre a UE e a
Turquia é "uma não solução". Disponível em https://www.publico.pt/mundo/noticia/ue-e-turquia-mais-perto-de-um-acordo-sobre-fluxo-de-refugiados-1725513?page=1#/comments.
Consultado a 15 de Março de 2016.
Fontes:
https://www.publico.pt/mundo/noticia/chipre-e-a-grande-barreira-ao-acordo-sobre-os-refugiados-com-a-turquia-1726377
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