Geograficamente posicionada
na Europa central, a Hungria tem sido historicamente pautada por um vasto
conjunto de invasões estrangeiras que, de uma maneira ou outra, tem ajudado a
construir a sua personalidade enquanto nação soberana dotada de desejos que
salvaguardem o seu interesse nacional no grande âmbito da sua política externa
actual.
É de salientar que a
sua política externa tem acompanhado as várias emergências e posteriores
colapsos de grandes potências do cenário internacional que a tem dominado, como
é o caso do Império Mongol e, mais recentemente, da ex União Soviética, á qual
esteve subjugada política, económica e socialmente. Do colapso desta última,
nota-se contemporaneamente o esforço húngaro de potenciar uma real reaproximação
à Europa e ao ocidente em geral.
Na sua mais recente
revisão constitucional (2011), são directamente expressos valores assentes
nesta pretensão. Esta partilha de valores verifica-se essencialmente na sua
relação e nos tratados consagrados com organizações internacionais tais como, a
Organização das Nações Unidas, a NATO, desde 1999, e para com a União Europeia
da qual é membro desde 2004. Porém, verificamos que estes valores apenas têm funcionado com um guia de
orientação impondo certos limites à efectiva tomada de decisão. A realidade é
que face às fraquezas que tem sido demostradas tanto pela UE como pela NATO
para lidar com os problemas emergentes do mundo actual, já para não falar das
dificuldades de resolução de problemas sociais intimamente ligados à crise
económica e de valores, a Hungria tem apostado antes numa estratégia mais
independente e voltada para si mesma por meio a se salvaguardar.
Sinteticamente, a Hungria
tem apostado numa política externa que passa pela consolidação do seu poder
interno, apoiando-se num governo nacionalista, autoritário, conservador,
centrado no fortalecimento da sua economia, da sua capacidade militar, xenófobo
e pouco tolerante com a diversa cultural e religiosa, sendo que a tensão que
existe entre Bruxelas e o governo do Viktor Orbán tem-se demonstrado uma
estratégia soberba nesta consolidação. Facto é que, não é aparente a intenção
de efectivo corte com qualquer uma destas organizações, e destas para com a
Hungria. Uma cisão seria, neste momento critico, desastroso para ambas as
partes já que, se para a Hungria isto significaria uma perda importante dos
seus mercados de exportação, para a Europa perder um Estado-membro agravaria
ainda mais tensão política, podendo mesmo espoletar uma saída em massa.
Nisto, também é verdade que a Hungria de
Viktor Orbán tem procurado o estabelecimento de uma política externa
multidimensional que melhore as suas probabilidades e beneficie a nação. Tem
essencialmente procurado estabelecer relações económicas e cooperativas com
grandes potências mundiais como a China, a Rússia e os Estados Unidos.
A verdade é que, sem
qualquer tipo de pudor a Hungria tem sabido aproveitar o melhor que cada uma
destas potências tem para oferecer sem comprometer a sua vontade interna, a
soberania nacional, o regime politico dominado pelo Fidesz,
que vem se fortalecendo desde 2011, e sem comprometer a sua segurança e a
sustentabilidade do seu desenvolvimento e crescimento.
Neste seguimento,
embora tenha sido feita vista grossa ao comportamento do governo húngaro
relativamente a esta estratégia, já que é um governo ideologicamente apoiado
num conjunto de valores que Bruxelas sabe que põe em risco princípios
fundamentais no qual assenta o projecto europeu, a reacção tarda, e alertar
para este facto é, no momento, de extrema importância.
Por outro lado, as notícias
que não tardam em chegar é da cada vez maior intransigência húngara para com
quem, fugido da guerra no médio oriente, chega na procura por uma vida melhor.
É de notar que este cenário nada tem nem novo, nem de antigo o suficiente para
que já nos tenhamos esquecido. Lembrar a forma como a Alemanha nazi projectou
os seus valores a nível geopolítico é ver espelhado na Hungria a urgência do
momento.
Posicionada na zona
a que Mackinder chama de Heartland, a Hungria é uma das portas de entrada da
Europa e do mundo ocidental. As fronteiras húngaras, são de facto consideradas
em muitos momentos ao longo da história, as fronteiras do ocidente sendo que se
identificam desde há muitos séculos como o último baluarte da civilização
ocidental cristã. Salienta-se portanto que, sendo uma área geográfica, assente
em valores de liberdade, direitos sociais e recursos capazes de criar
prosperidade aos povos que nela habitam então, e apoiando-me em Mackider «(…)
Who rules the Heartland commands the World Isla; Who rules the World Island
commands the World». Por outras palavras, arrisco dizer que o esquecimento das
realidades geopolíticas do momento, pode proporcionar no futuro um sério
redesenhar do mapa político europeu.
Posto isto, acredito
que se a Europa e o mundo continuarem a ignorar o contexto, politico e social
vivido em solo húngaro, quem sabe esta se torne uma potência desencadeadora dos
temores e dos terrores associados ao possível, e já previsível, colapso da UE e,
ao regime que fez outrora fez estalar a 2ª Grande Guerra.
Porém, e em
contraponto, partindo do princípio que em relações internacionais uma das mais
importantes premissas da lei internacional é que cada membro da comunidade
internacional tem por excelência o direito de defensa da sua soberania e de
defesa da integridade do seu território então, não esquecendo a história
tumultuosa de construção do Estado-nação húngaro, faz todo o sentido que a carência
de uma politica concreta capaz de solucionar os problemas imediatos associados
à vaga avassaladora de refugiados que nos tem chegado, bem como a falta de uma
linha orientadora de organização e pragmatismo para lidar como os problemas
futuros que esta vaga irá trazer às economias e as sociedades europeias, fazem
certamente com que o bloqueio à permanência desta cultura dentro das nossas
fronteiras, seja fundamentado. Na Hungria ainda são bem visíveis as tormentas
provocadas pela junção de povos historicamente divergentes graças às relações
conflictuosas que ainda hoje esta tem com países vizinhos (Sérvia, a Roménia, a
Ucrânia, a Croácia e Eslovénia e a Áustria).
Em suma, existe uma
hipótese muitíssimo significativa de, como diz o ditado, “quem quer mais do que
lhe convém, perder o que quer e o que tem”, ou seja, se por um lado se
compreende que é urgente o asilo destas gentes que, apenas querem prosperar num
ambiente de harmonia e de melhores oportunidades de vida, sendo que o ocidente
tem como primordial dever, pela sua trajectória histórica, ser capaz de
proporcionar isso mesmo aos povos que nela habitam, por outro, a Europa
encontra-se a braços com questões que certamente porão em causa a sua
sobrevivência enquanto organização forte e zelosa dos mais altos valores de
liberdade e de democracia.
A permanência destes
povos a logo prazo fará agravar problemas internos dos Estados, que nunca
deixaram de o ser e, até mesmo, fazer reemergir outros. O desastre poderá
ocorrer quando os filhos destas famílias que agora nos chegam, reivindicarem
direitos e/ou uniformizações comportamentais da sociedade, de acordo com a sua
própria cultura. Deixando de acatar ou, tentando alterar o nosso modo de vida,
será sim, para mim, o verdadeiro calcanhar de Aquiles com que a Europa se
defronta. Poderão surgir mais e, mais consolidados nacionalismos que poderão
desencadear, quiçá, guerras civis. Afinal de contas, o projecto europeu só teve
algum sucesso porque, embora inimigos em muitos momentos da história, os
Estados-membro partilham uma mesma cultura.
Contudo, não pondo
de parte o humanismo que ainda resta em mim, para que estas pessoas possam
habitar e prosperar em território europeu, será vital a discussão e promulgação
imediata de planos e leis que consigam no mínimo, lidar de forma coerente e
determinada com estas questões e de as efectivamente solucionar. Todavia não
deverá ser esquecido o dinamismo da questão, já que o passar do tempo nos
obriga a uma constante adaptação face aos novos valores e vontades que se
elevam, caso contrário, as consequências serão ruinosas e o trabalho já feito,
em vão.
Livros:
▪
Valente de Almeida, Políbio. 2012. Do
Poder do Pequeno Estado. Lisboa: Instituto Superior de Ciências Sociais e
Políticas
Fontes
electrónicas:
▪
Barata, Carla. 2015. “Governo da Hungria declara guerra aos imigrantes”.
Disponível em https://www.publico.pt/mundo/noticia/hungria-declara-guerra-aos-imigrantes-1706101. Consultado a 27 de Fevereiro de 2016
▪
Constitute project.org. 2015. –“Hungary’s Constitution of 2011”. Disponível em https://www.constituteproject.org/constitution/Hungary_2011.pdf.
Consultado a 27 de Fevereiro de 2016
▪
Euro Dialogue. 2013. “Hungary seeks a multidimensional foreign policy”.
Disponível em http://www.eurodialogue.eu/Hungary-seeks-a-multidimensional-foreign-policy. Consultado a 27 de
Fevereiro de 2016
▪
Euronews. 2014. “ Uma Política Externa a olhar para dentro”. Disponível em http://pt.euronews.com/2014/04/03/uma-politica-externa-a-olhar-para-dentro/. Consultado a 27 de Fevereiro de 2016
▪
Ministry of Foreign Affairs of Hungary. 2011. “ Hungary’s Foreign Policy after
the Hungarian Presidency of the Council of the European Union”. Disponível em http://eu.kormany.hu/admin/download/f/1b/30000/foreign_policy_20111219.pdf. Consultado a 27 de Fevereiro de 2016
▪
Shekhovtsov, Anton. 2015. “It’s Getting Ugly in Hungary”. Disponível em http://foreignpolicy.com/2015/05/20/its-getting-ugly-in-hungary/. Consultado a 27 de Fevereiro de 2016
Daniela Luís, nº 216282
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