O cessar-fogo na Síria teve inicio às 00:00 locais do dia 27 de Fevereiro. Este cessar-fogo
ocorre após um acordo entre EUA e Federação Russa e confirmação pelo Conselho de Segurança da
ONU, isto depois da última ter proposto um cessar-fogo para o dia de 1 de Março e apenas
contempla as forças Sírias e seus aliados e oposição Síria, não incluindo nem ISIL nem a al-Qaeda
na Síria (Jabhat al-Nusra). A intervenção Russa na Síria, a pedido de Damasco, teve início a 30 de
Setembro de 2015. Esta veio mudar completamente a dinâmica da guerra, colocando as tropas
governamentais de novo na ofensiva após pesadas derrotas entre Março e Maio de 2015 que
causaram então a perda quase total do que controlavam na província de Idlib (com excepção das
pequenas cidades de Fuah e Kefraya de maioria Xiita e da base aérea de al-Dhuhur, esta última
capturada no inicio de Setembro de 2015 pela Jabhat al-Nusra após um cerco de mais de 2 anos e
terminando com a execução de mais de 70 soldados) incluindo cidades estratégicas como Jisr alShughur
que ameaçavam a província de Latakia, um bastião de apoio a Bashar al-Assad e ao
Governo Sírio. Após a intervenção, como disse, o Governo Sírio passou da defensiva à ofensiva, e,
conjuntamente com o apoio aéreo da Rússia e apoio do Irão no que toca ao planeamento e liderança
das operações militares bem como com apoio de milícias Xiitas Afegãs e Iraquianas e forças de elite
Iranianas (a força al-Quds do Exército dos Guardiões da Revolução, em especial), lançou várias
ofensivas um pouco por todo o país, mas principalmente nas províncias de Latakia, Hama, Homs e
Aleppo. Estas culminaram até hoje no controlo de vastas áreas, incluindo a recuperação quase total
do território controlado por forças da oposição em Latakia e ainda no corte de uma linha de
abastecimento da cidade de Aleppo, que vinha da Turquia.
O cessar-fogo conta com apenas 4 dias, e, apesar de alguns confrontos esporádicos, verifica-se
uma redução sem paralelo da violência. Em algumas zonas, como Latakia, o cessar-fogo é como
se nunca tivesse entrado em vigor, mas, tal era de esperar para qualquer pessoa atenta ao conflicto,
uma vez que se trata de uma região vital para Damasco (por razões que já vimos acima) e o controlo
total da província é também essencial para a Rússia (que quer a fronteira Síria sob controlo de
tropas Sírias devido à Turquia) e para, eventualmente, uma futura ofensiva em Idlib. No entanto,
verificam-se várias violações do cessar-fogo que podem ditar o fim do mesmo: em Aleppo, no
distrito de Sheikh Maqsoud, forças da oposição “moderadas” e al-Qaeda que são fortemente
apoiadas pela Turquia (e diga-se mesmo lideradas, naquilo que tem sido a política de saudosismo
Otomano da Turquia em relação ao Norte da Síria, e em especial, a Aleppo, e o eterno ódio aos
Curdos) continuam a bombardear os Curdos (do YPG/J e da recém-criada SDF [Forças
Democráticas da Síria], coligação entre YPG e Rebeldes do Exército Livre Sírio[FSA] que recusam
cooperar com a al-Qaeda e outras forças Islamitas, bem como com outras unidades do FSA que
“recebem ordens da Turquia”) que ali vivem, ataques que recebem contra-ofensivas Curdas e
bombardeamentos Russos em troca; em Hama, numa zona conhecida como Sahel al-Ghab, tanto
tropas governamentais como forças da oposição continuam os combates, entre outros focos de
combate pelo país. Como se não bastasse, o facto da Jabhat al-Nusra não estar contemplada no
cessar-fogo faz com que todo o Norte da Síria (com excepção das zonas controladas claro por tropas
Sírias e pelo YPG/SDF) seja um alvo devido à cooperação das forças rebeldes e islamitas com este
grupo terrorista.
O cessar-fogo é um bom sinal, no entanto, é muito provável que não aguente. A 9 de Março
(se não forem adiadas outra vez), irão haver novas reuniões entre as várias partes do conflicto com o
Enviado Especial das Nações Unidas para a Síria, Staffan de Mistura, com o objectivo de continuar
as conversações de paz e de chegar à tão falada e digo, infame por esta altura, transição política,
para uma Síria livre de ISIL e al-Nusra e outros grupos terroristas, livre de Assad, democrática e
secular. As potências estrangeiras terão de chegar a algum consenso, uma vez que a Síria não é nada
mais, nada menos, do que um campo de batalha numa guerra de procuração envolvendo EUA,
Rússia, Irão, Turquia, Arábia Saudita, Qatar, entre outros e por vários motivos, desde o interesse
estratégico da Rússia na base marítima de Tartous à manutenção do Eixo da Resistência e do
Crescente Xiita pelo Irão (Irão-Iraque-Síria-Líbano) ou às pretensões neo-Otomanas Turcas no
Norte Sírio e o seu desejo de combate aos Curdos, vários são os interesses, nenhum deles
contemplando os do povo Sírio. E é devido a esta panóplia de interesses que é difícil chegar a
acordo de paz. Mesmo que as potências estrangeiras dissessem que sim a um acordo para a tal Síria
secular, democrática e livre de Assad, como é que grupos islamitas que recusam a democracia e o
secularismo (como é o caso dos grupos Ahrar al-Sham ou Jaysh al-Islam, que recusam a democracia
e o secularismo e são dos grupos mais poderosos na Síria) aceitariam um acordo de paz naqueles
termos (que é que os vários países dizem querer para a Síria)?
Gustavo Gomes Nº216302
Fontes:
http://www.reuters.com/article/us-mideast-crisis-syria-talks-idUSKCN0VJ0WZ
https://www.washingtonpost.com/world/middle_east/us-russia-brokered-cease-fire-goes-into-effectacross-syria/2016/02/26/36d7334a-dce7-11e5-8210-f0bd8de915f6_story.html
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