terça-feira, 29 de março de 2016

Tango à Americana

             
        Numa altura em que os holofotes estão maioritariamente voltados  para a reconciliação entre Washington e Cuba, com direito a concerto dos Rolling Stones e tudo, o mundo parece esquecer-se do importante encontro entre Obama e Macri, o recém-eleito presidente da República Argentina. Ora na passada quinta-feira, dia 24 de Março, o Presidente norte-americano, prestou então homenagem às 30 mil vítimas, no Parque da Memória em Buenos Aires, que a ditadura Argentina, apoiada pelos Estados Unidos, fez sem misericórdia.
            Quando tudo indicava que o pedido de desculpas iria ser feito finalmente, dado que não haveria oportunidade melhor do que esta visita simbólica para assumir algumas responsabilidades, heis que Barack Obama preferiu salientar apenas que “Houve controvérsia sobre as políticas dos Estados Unidos nesses dias negros e os Estados Unidos, quando refletem sobre o que se passou aqui, têm também de examinar as suas políticas e o seu próprio passado”. Acrescentou e admitiu ainda que o seu país foi algo lento a condenar as repetidas violações dos direitos humanos durante a “Guerra Suja” da ditadura (1976-1983), mostrando também a outra face da moeda ao defender Washington, argumentando que só existiu um apoio efectivo após a sublevação que afastou Estela Perón do poder.
            Ao coincidir com a passagem dos 40 anos do início da ditadura, Barack Obama parece querer trazer frescura às relações entre os EUA e Argentina, ou melhor dizendo, à ausência de relações, afirmando que “As democracias têm de ter a coragem de reconhecer quando não vivem à altura dos ideais que representam, quando são lentas a falar pelos direitos humanos. E esse foi o caso aqui”. Foi junto ao Mar del Plata que se ouviu o Presidente norte-americano, com uma paisagem de cortar a respiração, onde outrora milhares de  militares atiravam os corpos das vítimas sobrevoando os ares argentinos.
            A sintonia parecia reinar nos dois líderes políticos, aliás Mauricio Macri admitiu até que a empatia foi genuína, não se ficando apenas no campo político. Ciente da visita de Obama ao seu país, Macri, empresário cuja educação teve lugar nos Estados Unidos, admite que uma das suas prioridades centrais é restaurar as relações com importantes investidores internacionais, relações essas que caíram na inevitável degradação após dez anos de mandatos viciados na esquerda política com a forte marca família Kirchner. Neste sentido, este reatar de relações foi de tal modo crucial que a Argentina crê que com esta nova postura perante o mundo, este não se esqueça mais da sua importância e dos futuros contributos que este país latino poderá dar aos seus aliados.
            Todavia, chega a ser impressionante o impacto que tem a visita do chefe de Estado mais poderoso do planeta a um país, e com a Argentina não foi excepção, pois esta visita significou também o reconhecimento do governo de Macri,eleito em Novembro do ante passado, um governo de mudança e de reviravolta económica, bem distinto do governo anterior, pautado por um forte isolamento financeiro e político. Claramente, que o caminho a seguir parece ser agora outro para os argentinos, conscientes da relevância que possui a  cooperação com outros países e a criação de vínculos que fortaleçam a Argentina na esfera económica global.
            A verdade é que as surpresas não se ficaram por aqui, pois o Presidente norte-americano aproveitou esta visita histórica para anunciar a abertura definitiva dos arquivos militares e dos serviços secretos, arquivos esses considerados de máxima relevância para muitos historiadores, na medida em que auxiliam o entendimento do papel dos Estados Unidos enquanto país apoiante da ditadura argentina. De referir, que a abertura destes arquivos vão explicitar todos os planos que foram elaborados com o pior dos intuitos, pois ambicionavam a supressão de toda uma panóplia de activistas e guerrilheiros, na qual a maioria encontrava-se na mais tenra idade, e ainda o roubo desprezível dos filhos das mulheres infortunadas que davam à luz nas prisões.
            Assim, esta visita vem cumprir duas importantes promessas, cada uma correspondente a um líder, pois o norte-americano, que se encontra nos últimos quilómetros da maratona que foi a sua presidência, nunca escondeu o desejo de relançar a influência dos Estados Unidos em terras latinas, depois de inúmeros anos de desagradáveis relações. Por outro lado, Mauricio Macri, o Presidente que fez a Argentina virar à direita no espectro político, fez se eleger com a promessa de realinhar a economia, colocando o seu amado país nas principais linhas internacionais.
            Todos nós sabemos a influência de determinados países na arena política internacional, sabemos também que nem todas as peças do tabuleiro podem dar os mesmos passos, pois não têm o mesmo poder. O cenário apenas pode mudar quando uma das peças mais poderosas decide ficar à retaguarda de uma que não possui assim tanta influência no jogo, assim qualquer passo que esta dê em frente é legitimado pela maior. Curioso é, que tal como no tabuleiro de jogo, a realidade política internacional funciona de forma semelhante, basta reparar-mos no caso argentino com um governo “recém-nascido” e ainda sem resultados concretos da tão prometida metamorfose política, que até agora, não passa de uma importante, mas sublime promessa. Ora quando a potência que são, efectivamente, os Estados Unidos legitimam politicamente um país que se encontra nas mesmas condições que a Argentina, estão a deixar bem claro que não se trata apenas de uma simples legitimação, mas sim de um verdadeira aposta, que até teve direito a um tango dançado por  Obama, que sejamos sinceros, não se “safou” nada mal.


 Telma Pacheco nº216306


Fontes: 

http://observador.pt/2016/03/25/obama-ditadura-argentina-eua-lentos-falar-pelos-direitos-humanos/

https://www.publico.pt/mundo/noticia/em-buenos-aires-obama-abriu-os-arquivos-secretos-sobre-a-ditadura-argentina-1727202

http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/03/macri-espera-forte-investimento-dos-eua-apos-visita-de-obama-argentina.html

http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160324_obama_visita_argentina_if

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