quinta-feira, 7 de abril de 2016

Um Castelo de Cartas

“Panama Papers” é este o nome da maior revelação de informação alguma vez vista. Uma operação lançada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, com o objectivo de divulgar documentos entregues por uma fonte anónima, expondo uma intensa rede de empresas offshore detidas por personalidades conhecidas do mundo da política, dos negócios, da arte e do desporto.
Pouca seria a relevância dada aos envolvidos, caso não houvessem nomes como o de Vladimir Putin, Presidente da Rússia, como o do Primeiro-Ministro da Islândia, ou ainda o do falecido líder Líbio, Muamar Khadafi.
Já várias investigações foram abertas, no sentido de apurar quais eram os fins a que se destinavam estas offshores. É importante realçar que as offshores não são ilegais, serão, antes, pouco éticas porque são utilizadas para efeitos questionáveis como o de fugir às tributações elevadas de vários países. No entanto, o que importa desvendar são as contas que serviram de financiamento para guerras civis ou que foram utilizadas para camuflar negócios relacionados com o tráfico de droga e de influências.
Estas revelações já tiveram efeitos práticos, nomeadamente na Islândia. O Primeiro-ministro Sigmundur Gunnlaugsson está implicado nestes “Panama Papers”, sendo acusado de deter uma empresa offshore que era credora dos três bancos que faliram naquele país. A população islandesa não gostou de ver o nome do seu Primeiro-ministro nestes “papéis” e rapidamente saiu à rua pedindo a sua demissão. Consequentemente Sigmundur Gunnlaugsson pediu a dissolução do parlamento e a convocação de eleições antecipadas, não tendo o Presidente Grímssom avançado nesse sentido. Como tal, restou a Gunnlaugsson demitir-se, sendo agora o Ministro da Agricultura quem irá ocupar o lugar.
Paradoxalmente, na Rússia, o Presidente Vladimir Putin também estava referido nos documentos mas não assistimos a manifestações por parte do povo russo, apenas à negação de quaisquer ilegalidades por parte do Presidente. Será sempre motivo de estranheza que não haja reivindicações. Haverá problema quando passarmos a achar natural que os povos se contenham e curvem perante os aparentes actos de corrupção de que há muito ouvimos falar – situação recorrente no seio do poder do Presidente Russo. De um modo geral, as sociedades europeias já não têm medo de ir para a rua e a liberdade de expressão começa a ganhar força. Não seria de esperar que um país que abandonou a União Soviética e que assistiu à Glasnost de Gorbachev, revelasse um progresso democrático mais vincado e interventivo? Quanto a mim este aspecto merece uma atenta reflexão – política e sociológica - no sentido de entendermos o comportamento dos actores políticos russos e da própria população.
Importa sublinhar que estes escândalos mostram a fragilidade das democracias, tal como referiu o Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa. Apesar do caso “Panama Papers” ter envolvidas figuras de vários sectores da sociedade, os políticos serão sempre os mais visados, dada a responsabilidade e dever que têm pelos cargos que ocupam. É certo que após terem sido implicados actores políticos, agências de espionagem e indivíduos do mundo empresarial, pelas relações que têm com os primeiros, serão sempre alvo de muito maior escrutínio. Aos políticos será pedida mais clareza sobre as suas actividades financeiras externas aos cargos por eles ocupados, de modo a diminuir possíveis confrontos de interesses e a evitar casos como o do Primeiro-Ministro islandês.
Veremos se continuarão a aparecer empresas offshores com nomes de filmes do James Bond, usadas para camuflar operações de agentes da CIA. Este caso veio mostrar que os meios de comunicação são, por vezes, determinantes para a demonstração de práticas criminosas que chegam a envolver (como é o caso) um surpreendente número de indivíduos. Resta esperar como consequência uma maior transparência por parte dos actores políticos e daqueles que actuam de forma relevante nos panoramas político, financeiro e social.
Para já o castelo caiu como um castelo de cartas. Resta saber se os novos castelos serão de cimento e betão ou de papel e cartão.

João Cunha

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